Mitologias – Roland Barthes
ROLAND BARTHES, 1915-1980.
MITOLOGIAS, Mythologies, 1957.
Com uma série de cinquenta e três artigos sobre temas da atualidade, Barthes tenta decifrar a posição e o papel do mito em nossa sociedade. Partindo do princípio de que “o mito é uma linguagem” (hipótese
demonstrada na segunda parte), ele analisa as notícias de nosso cotidiano como signos de um real mistificado. Isso acontece com os espetáculos e a publicidade, em que os valores morais transparecem sempre através dos slogans ou dos gestos: tal detergente “extermina a sujeira” (mito purificador),
tal gângster mata com um simples olhar (movimento da cabeça ou do dedo ao cúmplice que executa) – mito da eficácia pura, em que nada precisa ser dito, pois tudo é ato realizado. Do mesmo modo, o retrato de um ator e a imagem de uma celebridade podem exprimir o mito do herói, do semideus…
Essa lista não é exaustiva: toda expressão do real, todo objeto do discurso pode constituir uma falsificação, uma mistificação cuja origem Barthes desvenda: a ideologia pequeno-burguesa. A crítica à pseudo-evidência (“o-que-nem-precisa-dizer”) é acompanhada por um panfleto social cínico contra os representantes da ordem: escritores, críticos, juristas, aristocratas… Todos querem preservar suas crenças numa pseudo-natureza reveladora – por esses objetos cotidianos – de verdades morais. É Carlitos (Chaplin), cego e mistificado, alienado nas mãos dos patrões, o melhor exemplo de abuso dessa ordem moral, mas que oferece ao mesmo tempo a solução social: o ato de
revolução.
Além de seu ataque virulento contra os pequeno-burgueses, em virtude do que há uma continuidade de pensamento com Marx e Sartre, Barthes quer reabilitar o real tornando-o compreensível, depurado dos mitos que o sobrecarregam inutilmente. Essa temática do mito lembra a utilização que
Platão fazia das alegorias (a da Caverna, a das almas aladas…). Em vez de se oporem, ambos têm a mesma perspectiva: explicar uma linguagem que expressa o mundo real.
É o sentido dessa semiologia do mito, análise linguística – a partir dos trabalhos de Saussure -, que constitui a segunda parte de Mitologias. Um de seus últimos textos, Fragmentos de um discurso amoroso (1977), retomará essa questão da difícil adequação da linguagem à realidade, porque os signos
são ininteligíveis ou mistificantes.
Edição brasileira: Mitologias, São Paulo, Difel, 1989.
Estudo: L.-J. Calvet, Roland Barthes, un regard politique sur le signe, Payot, 1973.