Discursos em Torno de Duas Ciências Novas
Retrato de Galileu Galilei pintado por Justus Sustermans em 1636. “National Maritime Museum”, Greenwich, Londres.
GALILEU (Galileo Galilei, dito), 1564-1642.
Discorsi e dimostrazioni matematiche intorno a due nuove scienze attenenti alla mecanica e i movimenti locali, 1638.
Quando, em sua residência vigiada de Arcetri, Galileu redige essa obra, a adesão ao heliocentrismo copernicano já está feita. Filosoficamente, esse texto não está à altura do Diálogo sobre os dois grandes sistemas do mundo, mas seu interesse científico não é dos menores, e para o epistemólogo ou o historiador das ciências, o que se faz nos Discorsi permanece como modelo de revolução científica. Maurice Clavelin assim resume a sua contribuição científica:
“Lançar as bases de uma inteligibilidade geométrica do movimento, ou seja, na realidade da própria natureza.”
Compassado por “Jornadas”, como o Diálogo, o texto começa com uma apresentação das duas ciências de que vai tratar: a teoria da coesão da matéria e a ciência do movimento. A primeira Jornada é dedicada à investigação das causas da coesão dos sólidos. Galileu, em sua resposta, mistura certas teses atomistas a afirmações ainda provenientes da escolástica (ele admite, por exemplo certa repugnância da natureza pelo vazio). No fim dessa primeira Jornada é elaborada, ao cabo de um prodigioso esforço teórico e experimental, a teoria da queda dos corpos. A segunda Jornada trata da resistência dos materiais; é provavelmente a parte mais envelhecida da obra.
A terceira e a quarta jornadas contêm o essencial da contribuição científica dos Discursos: a fundamentação da mecânica racional em bases matemáticas. Galileu desenvolve então, não sem encontrar muitos obstáculos (nem todos superáveis), a teoria do movimento inercial e do movimento dos projéteis.
O interesse despertado pelos Discorsi, no que se refere às duas ciências novas, reside também na compreensão sem precedentes da fecunda relação entre teoria e experiência. Esta é onipresente, e nunca permite que o raciocínio apriorístico imponha seus pontos de vista (como ocorre, por exemplo, em Descartes). Por outro lado, Galileu recusa-se a esvaziar a contribuição dos técnicos e dos artistas à pesquisa científica. Com ele começa o grande trabalho de reabilitação das técnicas que será concretizado, contra uma tradição bimilenar, pelo século das Luzes.
Edição brasileira: Discursos em torno de duas ciências novas, Rio de Janeiro, Museu de Astronomia, 1988.
Estudo: M. Clavelin, La philosophie naturelle de Galilée, col. “Philosophies pour l’âge de la science”, Armand Colin, 1968.