Linguagem e Mente – Noam Chomsky
LINGUAGEM E MENTE, Language and Mind, 1968.
Noam Chomsky.
Não deixa de ser paradoxal que o capítulo 3 dessa obra, intitulado “O Futuro” [estudos sobre a geração da linguagem], que reexamina em novas bases o antigo problema das relações entre pensamento e linguagem, apareça hoje como pertencente ao presente ou ao passado da lingüística.
Contudo, a questão colocada não é exatamente a questão da linguagem, mas sim do processo de aquisição e utilização da competência lingüística, mais precisamente dos fundamentos inatos dessa aquisição. O que Chomsky chama de competência designa uma capacidade de linguagem geneticamente determinada, uma combinatória de regras recursivas subjacentes que definem uma gramática universal e permitem que um indivíduo adquira uma língua. Chomsky a opõe à performance, que remete às estratégias empregadas para chegar a essa aquisição e também está associada a uma estrutura inata que determina sua expressão.
A competência lingüística – o conhecimento de uma língua – deve ser considerada como um sistema abstrato que serve de base à performance, sistema constituído por leis que concorrem para determinar a forma e o sentido intrínseco de um número potencialmente infinito de frases. Um tal sistema, chamado de “gramática gerativa”, define as propriedades formais de toda língua humana possível. “Uma gramática gerativa é um sistema composto por várias centenas de leis de tipos diferentes, organizadas segundo certos princípios fixos de ordem e de aplicabilidade, contendo uma infra-estrutura fixa que, do mesmo modo que os princípios gerais de organização, é comum a todas as línguas.” A distinção operacional entre estrutura superficial e estrutura profunda permite ter acesso à compreensão dessa organização subjacente. As línguas variam pouco em suas estruturas profundas, ao passo que pode existir grande variabilidade nas manifestações de superfície. As operações transformacionais ligam as duas.
Por conseguinte, uma pessoa que conheça uma língua específica possui uma gramática que gera – ou seja, caracteriza – o conjunto infinito de estruturas profundas potenciais, traçando seu mapa sobre o fundo das estruturas superficiais associadas e determinando as interpretações semântica e fonética desses objetos abstratos, embora a primeira (semântica) pareça regulada pela estrutura profunda, e a segunda (fonética), pela estrutura superficial. Nessas condições, a criança não pode saber, ao nascer, que língua aprenderá, mas deve saber que sua gramática tem uma forma predeterminada que exclui muitas línguas imagináveis: essa restrição inata constitui uma pré-condição, no sentido kantiano, para a experiência lingüística.
Estudo: J.-C. Milner, Introduction à une science du langage, Le Seuil, 1989.