Da Gramatologia
JACQUES DERRIDA, 1930-2004.
De Ia grammatologie, 1967.
Nessa obra, Derrida prossegue o debate iniciado com uma tradição filosófica que privilegia o lagos e é chamada de “logocentrismo”. Há três milênios a metafisica faz do lagos a base de toda a verdade e ostenta um flagrante fonocentrismo; mencionando os textos de Platão, mas também os de Aristóteles, por quem os sons são definidos como “símbolos dos estados d’alma”, Derrida vê nisso a identificação sistemática da escrita com um significante derivado, ou seja, um “suplemento da fala” (Rousseau). A filosofia teria, pois, rechaçado a escrita como queda na exterioridade do sentido – depreciação que se estende até a criação de oposições conceptuais bem conhecidas (entre significante e significado, exterior e interior). Contudo, essa crítica que orienta quase toda a obra não deve levar a esquecer sua parte diretamente exegética, pois a Saussure, a Lévi-Strauss e, principalmente, a Rousseau são dedicadas longas análises.
A análise do Ensaio sobre a origem das linguas”, de Rousseau, é mais que uma aplicação da matriz teórica da primeira parte: sem romper com a tradição que via nele a afirmação da prioridade do oral sobre o escrito, Derrida afirma que, de fato, Ro eau “havia sentido a esquivança na
própria palavra falada, na miragem de sua imediação”. A vontade derridiana de se desprender de uma ontologia que vê a escrita como auxiliar leva à adoção de uma nova maneira de ler os textos, de um método de leitura que se liberte das categorias clássicas da história das idéias e que se prive da presença última do texto: escrutando essa “diferância”, pela qual o texto excede sua situação logocêntrica, Derrida “desconstrói” o enunciado temático com o enunciado implícito.
Nesse sentido, Gramatologia é uma obra representativa da leitura derridiana dos filósofos nos anos 60: essa prática da desconstrução também era aplicada a outras formas de expressão, como demonstra Escritura e diferença * . Mas, com essas duas obras, Derrida formaliza a problemática da escrita – temática obsessiva, já presente em sua Introdução a A origem da geometria” – e começa a afastar-se dos trabalhos de Husserl.
Edição brasileira: Grama/o/agia, São Paulo; Perspectiva, 1973.
Estudo: G. Benington e J. Derrida, Jacques Derrida, Le Seuil, 1991.