Da Essência da Verdade – Martin Heidegger
Martin Heidegger
DA ESSÊNCIA DA VERDADE,
Vom Wesen der Wahrheit, 1943.
MARTIN HEIDEGGER, 1889-1976.
Em sua vontade de romper com o idealismo tradicional, Heidegger dedica-se ao projeto de conferir a importância devida à ideia de “verdade da coisa”. Por isso, descreve a operação do conhecimento. Parte do princípio de que, no processo do conhecimento, estamos “abertos” à coisa; mas essa atitude só é possível porque nosso comportamento em geral se define pela noção de “abertura”. A noção de abertura confunde-se, na verdade, com a liberdade propriamente dita, que “desvela” a coisa. Ora, se a coisa é, por isso mesmo, desvelada, é porque, antes, estava velada, dissimulada, exatamente como o Ser. É assim que Heidegger nos leva a compreender qual é o papel da filosofia, e o que lhe confere valor profundo, a saber, revelar-nos, pela tomada de consciência, a dissimulação do Ser.
Assim se coloca a questão de saber o que é a verdade. A verdade é compreendida de duas maneiras. É “verdadeiro” o ouro como coisa que se encontra em conformidade com aquilo a que visamos quando pensamos em ouro. Mas também é “verdadeiro” um enunciado que signifique ou expresse a coisa que julgamos. A verdade está toda vez “em concordância”: ela é “conformidade” ou justeza (Richtigkeit). De maneira geral, o “deixar-ser” pode ser pensado tanto como revelação quanto como dissimulação. Mas o Ser como existente total é obnubilado, oculto, não desvelado. Essa obnubilação vai impedir que a verdade se desvele. Toda a realidade humana é dominada por essa não-verdade. No entanto, não se trata de uma privação do Ser, mas do pressuposto do desvelamento, porquanto a verdade é esse desvelamento do Ser. O que significa que o horizonte da obnubilação é a condição necessária do desvelamento ou da verdade. Mas a própria dissimulação está dissimulada. É por isso que Heidegger fala do “esquecimento do Ser”. Assim, a questão da verdade remete à questão do Ser. Radicalizando-se, ela se torna a “verdade da Essência”, o advento do Ser no Dasein. O opúsculo termina com a observação de Heidegger de que o pensamento do “sentido do Ser” ou da “verdade do Ser” não foi ali desenvolvido. Cabe lembrar que é necessário que o desacerto abarque tudo o que fazemos. Visto estar cortada a sua relação com o mistério, o desacerto é considerado pelo filósofo como a antiessência fundamental; ele é a verdade inautêntica. Contudo, esquecido, o mistério nem por isso está eliminado. Na Introdução à metafísica,o homem chega ao nada; resta-lhe reaprender que o nada é o véu do Ser.
Estudo: B. Rioux, L’être et la verité chez Heidegger e Saint Thomas d’ Aquin,P.U.F., 1963.