O Método – Edgar Morin
MÉTODO (O), La méthode, 1977 a 1991.
EDGAR MORIN.
O método cartesiano deveria permitir que o homem “conduzisse bem sua razão e procurasse a verdade nas ciências”. Edgar Morin, ao redigir esse Método monumental, não tinha outra ambição. A não ser pelo fato de que sua dúvida, ao contrário da dúvida cartesiana, duvida de si mesma; a não ser pelo fato de que a verdade perseguida por Morin não se confina a “idéias claras e distintivas”. O método que ele elabora aqui não teme apreender a complexidade do real, ou seja, o fato de o homem ser ao mesmo tempo indivíduo biológico e ator social; de, na natureza, a ordem poder nascer da desordem, e vice-versa; de aquilo que limita o conhecimento ser também aquilo que o possibilita; de todo objeto de conhecimento, como bem vira Kant, trazer a marca do sujeito que o conhece, e, inversamente, todo sujeito cognoscente trazer a marca do mundo exterior dos objetos cognoscíveis.
Como é fácil entender, um plano desses dificilmente se acomoda a um método redutor e simplificador, que tenda a isolar os fenômenos do ambiente em que estão, a eliminar da observação o observador, a excluir da ciência tudo “o que não entra no esquema linear” usado como modelo por Descartes: o aleatório, o incerto, o complicado, o contraditório, o anormal. Trata-se ao contrário de adotar um “paradigma de complexidade” que permita conceber como interligado o que até então era considerado desligado. E Morin propõe-se derrubar as compartimentações e as alternativas que a história da filosofia erigiu em verdadeiros dogmas: dualismos homem-natureza, matéria-espírito, sujeito-objeto, causa-efeito, sentimento-razão, um-múltiplo…
O método adotado pelo autor baseia-se em três princípios, que, por sua vez, estão “em interação mútua: o princípio dialógico, que é definido como “associação complexa de instâncias, todas necessárias à existência, ao funcionamento e ao desenvolvimento de um fenômeno organizado”; o princípio recursivo, que dá conta dos processos “em que os efeitos ou produtos são ao mesmo tempo causadores e produtores no próprio processo, e em que os estados finais são necessários à geração dos estados iniciais”; e o princípio hologramático, segundo o qual “o todo está de certo modo incluído (engramado) na parte que está inclusa no todo”.
No último volume de O método (Idéias: habitat, vida, costumes e organização), Morin explora o mundo constituído pelas coisas do espírito: representações, linguagens, símbolos, mitos, crenças, noções, teorias. Como nascem, vivem e morrem as idéias que povoam a noosfera (seu meio próprio)? Qual é sua organização? Como uma religião consegue expulsar um mito? Como uma ideologia age para fazer desaparecer uma religião? Para o autor, estamos hoje na “pré-história do espírito humano”; é urgente “civilizar as teorias”, ou seja, torná-las abertas, complexas, autocríticas, reflexivas, aptas a auto-reformar-se e a dialogar umas com as outras sem dogmatismos ou doutrinarismos.
Edição portuguesa: O método, Lisboa, Europa-América, 1977.
Estudo: E. Morin, lntroduction à la pansée complexe, E.S.F., 1990.