Expressão e Significado
Expression and Meaning, 1979.
John Roger Searle, nascido em 1932.
Passando do direito ao fato, Searle submete aqui as exigências por ele formuladas em Os atos de fala à prova de três questões espinhosas de filosofia da linguagem. A propósito dos atos indiretos de linguagem ou enunciações não literais, o autor reconhece que os enunciados mais correntes da linguagem não são os atos diretos, em que o significado é facilmente estabelecido, visto que o falante quer dizer exatamente – literalmente – o que diz. O “princípio de exprimibilidade” proposto em Atos de linguagem adiara a questão da enunciação não literal, ao afirmar que sempre se pode dizer o que se quer dizer, que não existe resíduo inexprimível: toda intenção significante pode encontrar uma expressão exata, caso necessário enriquecendo a língua. Um discurso vago, irônico ou metafórico, portanto “indireto”, é de direito explicitável numa frase que complete seu ato de linguagem. Expressão e significado procura aquilo que ocorre quando a enunciação deixa de ser séria, e o sentido da frase empregada não coincide exatamente com o sentido que o falante pretende dar-lhe. A análise memorável do enunciado “Pode passar-me o sal?” estabelece um “princípio de conversação” – a suspensão das “pressuposições do uso padronizado” da língua: o falante comunica ao ouvinte mais do que diz efetivamente, baseando-se num segundo plano de informações compartilhadas. Os parceiros se entendem em função das regras depreendidas para os atos diretos de linguagem: o ouvinte reage do modo esperado pelo falante porque identificou os elementos lingüísticos por meio dos quais o falante invocava as regras que regem a “força diretiva” característica de cada ato ilocucionário.
No caso da ficção, encontra-se essa utilização não idiomática da língua. A ficção não é um ato ilocucionário nem a propriedade intrínseca de um texto que o faça reconhecer imediatamente como ficção, mas sim uma suspensão das injunções de crenças e dos compromissos relativos à existência – suspensão nascida de uma “tomada de posição ilocucionária” do autor, que não faz asserções, mas afirma fazê-las.
O uso metafórico da linguagem remete, portanto, a um “contexto”, conjunto de pressuposições e de informações prévias que intervêm na interpretação das frases. Assim, são os princípios gerais da comunicação que possibilitam entender uma mensagem de modo diferente daquilo que seu enunciado bruto significa. Ao contrário de Wittgenstein, para quem os tipos de frases são inumeráveis, Searle propõe um número limitado de atos ilocucionários. Enumera exatamente cinco: atos assertivos, comissivos, diretivos, expressivos e declarações. Os critérios dessa classificação são a conformidade das palavras ao mundo, do mundo às palavras, o ajuste nessas duas direções, ou em nenhuma.
Essas análises demonstraram ser fecundas, sobretudo por darem ensejo a uma concepção “dialógica” da interlocução. As conjecturas sobre a maneira como o ouvinte recebe as mensagens intervêm incessantemente na utilização da linguagem pelo falante. “Referente” e “contexto” não são noções simples; a comunicação implica aptidão para a metacomunicação. As pesquisas de Searle serão prolongadas pelo estabelecimento de uma tipologia dos diálogos e pela determinação das regras que condicionam seu sucesso ou seu malogro (trabalhos de Francis Jacques).
Edição brasileira: Expressão e significado, São Paulo, Martins Fontes, 1995.
Estudo: F. Jacques, Dialogiques. Recherches logiques sur le dialogue, P.U.F., 1979.